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Espécies alóctones, ecologia da paisagem e conservação: qual a conexão entre eles?
Por: Natasha Grosch Loureiro                                          
Postado dia 02/11/2020
Mestranda no PPG em Ecologia, Conservação e Manejo da Vida Silvestre (UFMG)









No mundo globalizado em que vivemos diversas ações ameaçam a integridade da biodiversidade dificultando sua conservação. Muitas delas podem resultar de atividades antrópicas, tais como a fragmentação e perda de habitats, introdução de espécies alóctones (aquelas que não ocorriam originalmente em determinada área biogeográfica), superexploração de recursos naturais, tráfico de espécies e poluição ambiental. No Brasil, grande parte dos nossos biomas foram intensamente reduzidos em prol da expansão urbana, industrial e agrícola, o que obviamente resulta em fragmentação e consequente perda de habitats.

A fragmentação consiste numa ruptura da continuidade ambiental, em escala de paisagem. Em geral, a fragmentação reduz uma área natural contínua a fragmentos de menor tamanho, diminui a disponibilidade de condições e recursos favoráveis à manutenção de muitas espécies, aumenta a extensão de bordas e isola populações, através da redução da conectividade da paisagem (Fahrig, 2003). Esta é, por exemplo, a realidade da Mata Atlântica que atualmente retém apenas 12,4% de sua extensão original (SOS Mata Atlântica, 2019). A maioria dos remanescentes de Mata Atlântica são fragmentos menores que 50 ha isolados entre si (Ribeiro et al., 2009). Esta fragmentação e suas consequências dificultam a atuação de profissionais da conservação, que precisam buscar alternativas viáveis para atenuá-las sendo a mais difundida a implantação de corredores ecológicos.

Neste contexto de fragmentação, a fauna e flora enfrentam ainda outra ameaça em larga escala, que é a introdução de espécies alóctones. Esta introdução pode ocorrer por via natural através de expansão da área de ocorrência, ou pode ser mediada por via antrópica, por meio da introdução de espécies alóctones. Se estas forem capazes de se estabelecer (e ampliar sua ocorrência na região) elas passam a ser consideradas invasoras, com potencial de interferir no ecossistema local, sobrepujar e levar espécies nativas à extinção. Em geral, espécies invasoras podem ser boas competidoras das espécies nativas, por isso, mais eficientes em utilizar os recursos dos quais as nativas dependem, extinguindo-as localmente. Os riscos são ainda maiores quando as espécies alóctones são introduzidas em regiões onde ocorrem naturalmente espécies do mesmo gênero ou família, uma vez que pode haver alta sobreposição de nicho, e consequentemente aumento da competição interespecífica (e.g. Oliveira & Grelle, 2012). Uma consequência destas introduções é a homogeneização biótica, que ocorre como uma substituição gradual de espécies nativas por espécies alóctones (Olden, 2006).
Imagem Bocaina

Figura 1. https://mapbiomas-br-site.s3.amazonaws.com/Infograficos/Colecao5/MBI-Infografico-mataatlantica-5.0-BR.jpg

Ao planejarmos o manejo destas espécies alóctones, reduzindo ou eliminando localmente suas populações, é de suma importância considerar características de história de vida, tais como capacidade de dispersão e migração. Uma abordagem que vem subsidiando os estudos que podem facilitar e tornar o manejo eficiente é a ecologia da paisagem, pois essa abordagem fornece uma perspectiva especial ampla da situação que incluem a avaliação dos efeitos das características de história de vida, dispersão e migração.

A Ecologia da Paisagem é um ramo da ecologia que estuda a relação entre os processos ecológicos e os padrões estruturais e funcionais da paisagem, em diversas escalas (Forman & Godron, 1986). As técnicas e procedimentos associados ao estudo da paisagem permitem a compreensão de alterações de uso e cobertura de solo, fragmentação de habitats, tolerâncias ecológicas e necessidades mínimas para a persistência e dispersão de espécies, por exemplo. Análises que levam em consideração essa perspectiva espacial podem facilitar tomadas de decisão mais acertadas e torná-las mais precisas e técnicas em termos de conservação e manejo. Este tipo de análise fornece subsídios para definir áreas prioritárias para conservação, manejo de espécies, planejamento de áreas para restauração ecológica e a criação de corredores ecológicos.

Os algoritmos (operações computacionais definidas por regras matemáticas) envolvidos nos procedimentos da ecologia da paisagem permitem avaliar parâmetros com menor taxa de erro. Este tipo de estudo possui outra vantagem que é a redução de investimentos de recursos financeiros e humanos, já que diminui a necessidade de campanhas de campo, embora não as dispensem completamente. Aliar o conhecimento dos pesquisadores, o trabalho de campo e técnicas inovadoras parecem ser o melhor caminho para auxiliar a conservação de espécies em nosso atual contexto ambiental e econômico.







Referências

FAHRIG, L. 2003. Effects of Habitat Fragmentation on Biodiversity. Annual Review Of Ecology, Evolution, And Systematics, 34(1):487-515.

FORMAN, R. T. T. & Godron, M. Landscape ecology. New York, Wiley, 1986.

OLDEN, J. D. Biotic homogenization: a new research agenda for conservation biogeography. Journal Of Biogeography, 33(12):2027-2039.

OLIVEIRA, L. C. & Grelle, C.E.V. 2012. Introduced primate species of an Atlantic Forest region in Brazil: present and future implications for the native fauna. Tropical Conservation Science, 5(1):112-120.

RIBEIRO, M.C., Metzger, J.P., Martensen, A.C., Ponzoni, F.J., & Hirota, M.M. 2009. The Brazilian Atlantic Forest: How much is left, and how is the remaining forest distributed? Implications for conservation. Biological Conservation, 142(6):1141-1153.

SOS MATA ATLÂNTICA, 2019. Nove dos 17 estados da Mata Atlântica estão no nível do desmatamento zero, aponta estudo. Disponível em: https://www.sosma.org.br/108410/atlas-da-mata-atlantica/. <Acesso em: 30 de setembro de 2019>.