Postado dia 02/08/2021
Biólogo (Mackenzie – São Paulo), Mestre em Ecologia e Evolução (UNIFESP - Diadema), Especialista em Gestão Ambiental (Universidade Estácio de Sá – São Paulo), doutorando em Ecologia e Biodiversidade (UNESP – Rio Claro) e Sócio diretor da Ecoview Soluções Ambientais. Experiência em trabalhos com Ecologia, Ecofisiologia animal e Consultoria ambiental Seja por dormirem de ponta cabeça ou por alguns alimentarem-se de sangue, inúmeros mitos e curiosidades a respeito dos morcegos despertam a imaginação das pessoas, muitas vezes gerando repulsa e incompreensão popular acerca desses animais magníficos. Quem nunca ouviu falar dos vampiros? Criaturas meio homem meio morcego que se alimentam de sangue. Quem nunca acreditou que um morcego voando perto de si é sinal de perigo? Que todos transmitem doença? O que ainda é desconhecido de fato pela maioria das pessoas é a importância que os morcegos têm para a manutenção dos ecossistemas terrestres e consequentemente para a humanidade. Vamos então primeiramente esclarecer alguns mitos.
Presentes na Terra há pelo menos 50 milhões de anos, eles estão em todos os continentes, exceto nas regiões polares, e são reconhecidos por apresentar extensa diversidade alimentar. De acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) existem atualmente 1293 espécies catalogadas, com dietas que variam entre frutos, sementes, folhas, néctar, pólen, artrópodes, pequenos vertebrados e peixes, sendo apenas três consideradas hematófagas, ou seja, que realmente se alimentam de sangue. No Brasil já foram identificadas 180 espécies, estando entre elas as três espécies hematófagas (Desmodus rotundus, Diphylla ecaudata e Diaemus youngi). A espécie Desmodus rotundus (Fig. 1) alimenta-se preferencialmente de sangue de mamíferos silvestres de grande porte, mas em decorrência da expansão da pecuária a espécie passou a incluir em sua dieta sangue de animais de criação, como gado, cavalos, porcos, cachorros, aves e ocasionalmente seres humanos. Embora D. rotundus seja considerada o principal vetor de raiva silvestre, a potencial transmissão para seres humanos é baixa, os casos são raros e geralmente acontecem com pessoas que apresentam condições de vida e de moradia precária. No Brasil no período de 2010 a 2020 foram registrados somente 20 casos de raiva onde os morcegos foram os transmissores, uma média de dois casos por ano. Se arredondarmos para 200 milhões a população atual do país, as chances anuais que uma pessoa tem de contrair raiva pela mordida de um morcego é de 1 em 100 milhões, isso sem levarmos em consideração fatores como moradia e condição de vida.
Figura 1: O morcego hematófago Desmodus rotundus - Fotografado por Matheus Fernandes Viola
Mas por que então as vezes eles voam tão perto dos humanos? Geralmente esses relatos ocorrem próximo a arvores ou postes de iluminação provavelmente por estarem atrás de frutos ou insetos para se alimentarem, entretanto, seu voo baixo acaba assuntando as pessoas. Por outro lado, algumas vezes os morcegos voam em direção à pessoa para localizá-la pelo radar e perceber se o indivíduo representa ou não uma ameaça. Ironicamente isso pode acontecer por que eles têm fome, mas não de sangue, e também porque se sentem ameaçados. No final das contas nós somos os vilões e não eles.
conservação da biodiversidade