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Restauração Ecológica e a Conservação de Primatas em Fragmentos Tropicais
Autores do Blog Ciência em Ação

Por: Ephraim Luiz de Andrade França
Postado dia 13/11/2021

Biólogo e mestre em biodiversidade e conservação pela Universidade Estadual de Londrina - UEL. Já atuou como educador no ensino básico, promovendo a discussão da ecologia, consumo e conservação. Em 2018 fundou juntamente com uma equipe o Laboratório de Ecologia e Comportamento Animal da UEL. Junto ao grupo, desenvolveu atividades de pesquisa em ecologia comportamental, incluindo os temas de comportamento social, sexual e brincadeira. Atualmente se aproxima à discussão de temas relacionados à sustentabilidade, ambiente, social e governança e mudanças climáticas.















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A biodiversidade nas florestas tropicais tem sido reduzida pela ação antropogênica de conversão de áreas (CHAPMAN & LAMBERT, 2000). As áreas de cobertura vegetal são impactadas por corte seletivo de madeira, que impacta a biodiversidade vegetal, além da conversão em áreas destinadas à agricultura e pecuária, associadas à incêndios intencionais e fragmentação florestal (PERES et al., 2010). Biomas tropicais, como a Amazônia, são responsáveis por grande parte da biodiversidade global, apresentando os maiores índices de diversidade em diversos grupos taxonômicos como plantas lenhosas, borboletas, lagartos e mamíferos não-voadores (PERES et al., 2010). Dentre os mamíferos, 90% de toda a riqueza de primatas ocorre em florestas tropicas asiáticas, africanas e neotropicais e o fator mais significante para o declínio dessa diversidade é a destruição de habitats (MITTERMEIER et al., 1989).

Os primatas dependem da presença florestal, sendo desproporcionalmente afetados pela fragmentação. As extinções de populações estão altamente relacionadas à pequenos e médios fragmentos, enquanto que fragmentos maiores tendem a conservar as populações e espécies (SHARMA et al., 2013). Fatores socioecológicos das espécies também são determinantes para sua distribuição e sucesso em ambientes degradados e secundários, destacando-se a massa corpórea, terrestrealidade e nível de frugivoria desses animais (JOHNS & SKURUPA, 1987; FIMBEL, 1994). Dessa forma, os fragmentos são essenciais na conservação do pool de espécies para o grupo.

Em ecossistemas tropicais primários, os primatas são importantes agentes de dispersão. Em ambientes sucessionais, no entanto, as funções ecológicas variam em função da especificidade dos grupos. Esses ambientes tendem a ser mais oportunísticos às espécies menores, responsáveis pela dispersão de pequenos frutos, enquanto que os dispersores de maior tamanho, responsáveis pela dispersão de maiores frutos, geralmente sofrem pressão seletiva em seu deslocamento espacial e devido à caça (CORLETT, 1995). Essa dinâmica varia também dentro dos grandes grupos de primatas, sendo que populações Plathyrrhini (macacos do Novo Mundo) tendem a não cruzar áreas abertas e pastos, enquanto que alguns Catarrhini (macacos do Velho Mundo) apresentam essa capacidade (JANZEN & VAZQUEZ-YANES, 1991).

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Figura 1: Macho adulto de macaco-prego preto (Sapajus nigritus), um Platyrrhini, sobre um telhado. Foto: Ephraim A. França, Autor.

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Figura 2: Um gorila (Gorilla gorilla gorilla), um Catarrhini, deslocando-se entre dois fragmentos. Foto: Sophy Roberts.

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Um ambiente secundário em restauração, portanto, tende primariamente a ser colonizado por primatas com capacidade de movimentação terrestre e que possam utilizar suportes proporcionados no manejo florestal. Esse favorecimento a espécies terrestres também ocorre devido à reduzida diferenciação de nichos verticais em áreas de restauração, que apresentam copas com alturas inferiores a florestas primárias, além de menor estratificação (CORLETT, 1995). Outro fator de colonização já apontado é a frugivoria desses animais, que se relaciona de maneira específica com as características ambientais. Em ambientes secundários iniciais com plantas colonizadoras e frutívoras, como Cecropia, que integra a alimentação de alguns Cebóides, alguns clados tem seu sucesso favorecido (ROTTA, 2016; FIMBEL, 1994). Oportunistas e generalistas frugívoros e insetívoros são favorecidos e atraídos pela grande abundância de frutas e insetos nessas áreas e são importantes promotores da sucessão (CAMPOS et al., 2012).

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Figura 3: Correlação entre o ranking de uso de habitats degradados e o ranking de frugivoria na dieta de seis espécies de primatas em Tiwai, Serra Leoa (FIMBEL, 1994).

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Os primatas são alvos e facilitadores da conservação de suas próprias e outras populações e indica-se que a incorporação de áreas degradadas ao manejo de conservação dos primatas é uma importante estratégia (CHAPMAN & LAMBERT, 2000). Além dos benefícios à diversidade animal não-humana e vegetal, os primatas relacionam-se à promoção de um ambiente adequado à provisão econômica de comunidades humanas, restaurando funções e serviços ecológicos (SCHWITZER et al., 2011).

O sucesso desses organismos em áreas de sucessão e restauração pode ser afetado pela presença de espécies invasoras que, devido a seu oportunismo, geram pressão sobre os organismos nativos e tornam-se espécies chaves na restauração, requerendo ações de controle (NICHOLS & GRANT, 2007). O manejo deve envolver a seleção de áreas para a consolidação de corredores ecológicos, interligando fragmentos próximos que apresentem maiores populações de primatas. Além do arranjo estrutural, análises comportamentais dos grupos são necessárias para a predição de corredores com arranjos funcionais, verificando a distribuição dos bandos, distância intragrupo e sua capacidade de dispersão por fragmentos adjacentes (FIMBEL, 1994; CREPALDI, 2015).

O planejamento de corredores é uma ferramenta para o desenvolvimento de metapopulações, apontado como importante aspecto para a conservação das espécies, já que permite o fluxo gênico e aumenta o número médio de alelos e haplótipos e riqueza de alelos (CREPALDI, 2015). Áreas em restauração, por vezes, não apresentam a complexidade estrutural necessária para o estabelecimento de populações, entretanto, podem ser consideradas áreas de forrageio, abrigo e deslocamento, funcionando como trampolins ecológicos – dinâmica que favorece metapopulações e o sucesso da restauração (CAES, 2009).

Além das translocações naturais, alternativas de manejo com 
o a reintrodução de animais reproduzidos em cativeiro, reintrodução mista (cativeiro, selvagem), translocação manejada e dispersão de indivíduos manejada são alternativas para a colonização de ambientes secundários. Contudo, as técnicas manejadas exigem conhecimento da ecologia e comportamento das espécies e as intervenções variam especificamente, sendo necessário o acompanhamento anterior e posterior ao manejo (KIERULFF et al., 2007).

Vídeo 1. Quanto + mico melhor! (Associação Mico Leão Dourado, 2017).

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Certas condições são necessárias para o início de um processo de restauração visando a conservação de espécies. Condições societais como: educação ambiental para a conservação, visando evitar a caça, captura e extração de madeira e manutenção de áreas de conservação em espaços agronômicos; medidas legais para a conservação de áreas e espécies; e financiamento governamental e não governamental em programas de preservação, são a base para a promoção de manejos conservacionistas. Esforços de conservação também requerem a exploração de antigos manejos e da história de vida das espécies (CHAPMAN, 2018).

A pesquisa em ecologia comportamental de primatas para a realização de manejos é fundamental em diversos aspectos. Habitat e dieta são essenciais para a escolha de espécies vegetais apontadas para a restauração (CREPALDI, 2015; CHAPMAN, 2018). Além da fragmentação, conhecer a intensidade de impactos geográficos e informações em genética da conservação são valiosas na determinação do manejo das populações (CHAPMAN, 2018). Para a conservação de populações, prioriza-se a preservação de fragmentos, evitando perda de áreas conservadas, continuada com a ação de restauração de habitat primata. Essas ações atuam sobre a paisagem e ecossistemas influenciando diretamente sobre as assembleias de primatas e promovendo sua conservação (SHARMA, 2013). Os primatas são um grupo reconhecido pela população, o que favorece medidas de proteção que envolvam sua utilização como “espécie-bandeira” ou “espécie-guarda-chuva”, alinhando a restauração ecológica com estratégias de conservação para diversos grupos (CHAPMAN, 2018).

Diversos âmbitos demonstram a importância de Primates para a conservação e preservação de biodiversidade, atuando sobre medidas de restauração ecológica e impactando o estudo da ecologia da conservação. A presença desse grupo em manejos de sucessão em ambientes tropicais é essencial e pode ser um dos indicativos de sucesso de restauração. Características que conferem ao táxon uma importância social e econômica também favorecem a promoção de medidas governamentais e não-governamentais para a preservação dos primatas em áreas tropicais.

Referências:CAES, Beatriz R. M. 2009. Mastofauna terrestre associada a áreas em processo de restauração na fazenda experimental Edgárdia, Botucatu – sp. Dissertação de mestrado pela Faculdade de Ciências Agronômicas da Unesp, Mestrado em Ciências Florestais.
CAMPOS, Wanuza H. et al. Contribuição da fauna silvestre em projetos de restauração ecológica no Brasil. Pesq. Flor. bras. 72: 00-00, 2012.
CHAPMAN, Colin A. A road for a promising future for China’s primates: The potential for restoration. Zoological Research 39(4): 244–248, 2018.
CHAPMAN, Colin A.; LAMBERT, Joanna E. Habitat Alteration and the Conservation of African Primates: Case Study of Kibale National Park, Uganda. American Journal of Primatology 50:169–185, 2000.
CORLETT, Richard T. Tropical Secundary Forests. Progress in Physical Geography 19(2):159-172,1995.
CREPALDI, Maria O. S. 2015. Conectando florestas e primatas: as mudanças no uso da terra para a conservação do Muriqui-do-norte (Brachyteles hypoxanthus Kuhl, 1820) em propriedades rurais. Tese de doutorado pela Universidade de São Paulo, Doutorado em Ciência Ambiental.
FIMBEL, Cheryl. Ecological correlates of species success in modified habitats may be disturbance- and site-specific: the primates of Tiwai island. Conservation Biology 1(8): 106-113 1994.
JANZEN, Daniel H.; VAZQUEZ-YANES, Carlos. Aspects of tropical seed ecology of relevance to management of tropical forested wildlands. In Gomez-Pompa, A., Whitmore, T.C. and Hadley, M., editors, Rain forest regeneration and management. Paris: UNESCO, 137-57, 1991.
JOHNS, Andrew D.; SKORUPA Joseph P. Responses of rain-forest primates to habitat disturbance: A review. International Journal of Primatology 8: 157-191, 1987.
KIERULFF, Maria C. M. et al. Manejo para a conservação de primatas brasileiros. A Primatologia no Brasil 10: 71-99, 2007.
MITTERMEIER, Russel A. et al. Neotropical primate conservation. Journal of Human Evolution 18: 597-610, 1989,
NICHOLS, Owen. G; GRANT, Carl D. Vertebrate fauna recolonization of restored bauxite Mines‐Key findings from almost 30 years of monitoring and research. Restoration Ecology 15:116–126, 2007.
PERES, Carlos A. et al. Biodiversity conservation in human-modified Amazonian forest landscapes. Biological Conservation 143: 2314–2327, 2010.
ROTTA, Gustavo. 2016. Ecología trófica de los monos aulladores negros y dorados (Alouatta caraya, Atelidae) en el gradiente latitudinal de la selva de inundación del río Paraná Medio. Tese de doutorado pela Faculdade de Ciencias Naturales y Museo, Doutorado em Ciências Naturais.
SCHWITZER, Christoph et al. Responses of animal to habitat alteration: an overview focusing on primates. Endang Species Res 14: 31–38, 2011.
SHARMA, Narayan. et al. Local and Landscape Correlates of Primate Distribution and Persistence in the Remnant Lowland Rainforests of the Upper Brahmaputra Valley, Northeastern India. Conservation Biology 00(0): 1–12, 2013.

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