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O Importante Papel do Sensoriamento Remoto para Conservação dos Ecossistemas
Por: Juliana Maria Ferreira de Souza Diniz                     Postado dia 03/12/2020Mestre e Doutoranda em Sensoriamento Remoto – INPE
Engenheira Florestal – UFLA
Criadora de conteúdo digital – RadarGeo (@radar.geo)









Desde os primórdios da existência humana o ser humano utiliza dos recursos provenientes da natureza como uma forma de sobrevivência. No entanto, a explotação dos recursos naturais foi se intensificando ao longo das décadas, principalmente após a Revolução Industrial, pois a produtividade e o capitalismo começaram a falar mais alto do que a conservação dos recursos naturais. Hoje em dia, reconhece-se que a conservação da natureza é uma necessidade, devido às altas perdas de biodiversidade em praticamente todo o planeta e também como uma forma de redução das mudanças climáticas globais.

Os ecossistemas ao redor do mundo vêm sofrendo constantemente as consequências causadas por meio de diversos tipos de alterações como desmatamentos, incêndios, surto de insetos, entre outros. Essas alterações provocam disrupções da estrutura das comunidades, da composição em espécies e nas funções que um ecossistema desempenha, além de também diminuir a disponibilidade de recursos para muitas espécies (WHITE; PICKETT, 1985; SEIDL et al., 2017).

De acordo com Lambin (1997), muitas das mudanças no uso da terra que apresentam grande impacto climático e ecológico estão ocorrendo em regiões tropicais, como fragmentação, desmatamento e urbanização. A incorporação de áreas florestais para uso antrópico acontece na maioria das vezes, sem planejamento, provocando mudanças significativas em algumas regiões. Dentre essas mudanças, o desmatamento representa uma das maiores ameaças ao meio ambiente (LORENA, 2008).

Segundo Oliveira (2016), o maior problema na alteração do ambiente nos dias atuais está na velocidade e escala com que estas modificações estão ocorrendo. De acordo com Morales-Hidalgo et al. (2015), de 1990 a 2015 a perda de florestas primárias tropicais foi de aproximadamente 2 milhões de km²!

Desse modo, entender em detalhes o processo de mudança no uso e cobertura da terra é fundamental para o planejamento e gerenciamento dos recursos naturais. Uma das formas de entender esse processo é por meio de utilização das técnicas de sensoriamento remoto. Desse modo, é possível mapear o tipo de uso e cobertura da terra de forma rápida e eficaz, permitindo a identificação, avaliação e monitoramento das alterações em escalas espaciais e temporais (ENGELBRECHT et al., 2017).

Com avanços das tecnologias e, principalmente, das tecnologias espaciais, as informações provenientes de sensoriamento remoto têm se tornado cada vez mais difundidas e necessárias para compreender a dinâmica existente entre as atividades do homem e os ecossistemas. Através de dados de sensoriamento remoto é possível obter informações sobre mudança, degradação e fragmentação de habitat, assim como a disseminação de espécies invasoras (MUCHONEY; WILLIAMS, 2010).

Entre os instrumentos que proporcionam a obtenção dos dados de sensoriamento remoto, existem os sensores passivos (ópticos) e os ativos. Os sensores ópticos utilizam da radiação solar como sua principal fonte de energia, enquanto os sensores ativos emitem a sua própria fonte de radiação, podendo realizar a aquisição de imagens em períodos diurnos e noturnos, e são menos influenciados pelas condições atmosféricas.

A utilização de dados ópticos orbitais teve início com o Satélite ERTS-1 (Earth Resources Technology Satellite) em 1972, posteriormente renomeado para Landsat-1. A série Landsat é um grande exemplo da utilização de dados de sensoriamento remoto para análise temporal das mudanças no uso e cobertura da terra e outras aplicações de monitoramento ambiental, apresentando uma grande importância devido a sua base de dados histórica e a sua contínua atualização (Figura 1). A partir daí muitos outros satélites foram lançados e as técnicas para explorar suas capacidades foram se desenvolvendo cada vez mais (BOYD; DANSON, 2005).
Imagem Bocaina

Figura 1. Série histórica do sensor Landsat. Fonte: Divisão de Geração de Imagens – INPE

Outros sensores ópticos como Indian Remote Sensing Satellite (IRS) e SPOT também apresentam dados com grandes séries temporais, facilitando e auxiliando nas análises e monitoramento do ambiente. Além disso, os sensores ópticos permitem a obtenção de índices de vegetação. Dentre os índices de vegetação mais utilizados ao longo dos anos, destaca-se o NDVI (Normalized Difference Vegetation Index) (ROUSE et al., 1974), que apresenta uma grande relação com biomassa, índice de área foliar, produtividade primária, radiação fotossintética, e outros (TEILLET et al., 1997). Além do NDVI, outros índices de vegetação são aplicados para destacar os parâmetros da vegetação, como por exemplo o EVI (Enhanced Vegetation Index; Justice et al. (1998)), o GEMI (Global Environment Monitoring Index; Pinty e Verstraete (1992) e outras razões entre bandas do espectro eletromagnético.

Recentemente, têm-se observado uma maior utilização de índices derivados da faixa espectral red edge, que se tornaram mais frequentes com o lançamento do satélite Sentinel-2 pela Agência Espacial Europeia. Essa faixa espectral varia entre 690 a 730 nm e permite uma melhor diferenciação entre a reflectância do solo e da vegetação, pois abrange a faixa de absorção da clorofila e a reflexão da estrutura das células foliares, permitindo maiores informações para a caracterização da vegetação. Alguns estudos demonstraram que os índices red edge podem favorecer a estimativa de volume e biomassa em relação aos índices tradicionais (EISFELDER et al. 2012; KROSS et al. 2015).

Diferentemente dos dados ópticos, que estão limitados à obtenção de informações relacionadas às copas das árvores, os dados de sensores ativos, como é o caso dos dados multipolarizados SAR (Synthetic Aperture Radar) permitem a obtenção de informações sobre rugosidade, morfologia da árvore, densidade da copa e umidade do solo, por apresentaram uma maior penetração no dossel florestal (Figura 2) (ALI et al., 2015). Além disso, o sensoriamento remoto ativo, por ser menos influenciado pelas condições atmosféricas, permite o monitoramento em condições de nuvens e neblina, que são um grande desafio para a eficiência o monitoramento óptico. Com isso, os dados SAR fornecem oportunidades significativas para monitoramento da paisagem.
Imagem Bocaina

Figura 2. Interação com a copa das árvores a partir de sensores ópticos (a) e de sensores ativos SAR (b). Fonte: Boyd e Danson (2005).

Além dos dados SAR, têm-se ainda a utilização de dados LiDAR, que são sensores remotos ativos caracterizados pela emissão de milhares de pulsos por segundo sob uma superfície. Geralmente os dados LiDAR são obtidos através de sensores aerotransportados. A partir desses dados, é possível obter mapas topográficos com alta resolução (COOPS et al. 2007), biomassa acima do solo e também dados de estrutura florestal, como altura e cobertura, informações que estão diretamente relacionadas com as condições da floresta e com os regimes de perturbação (NAGENDRA, 2013).
Imagem Bocaina

Figura 3. Representação dos dados LiDAR: a) Nuvem de pontos LiDAR. b) Modelo de Altura da Copa. Fonte: White et al. (2016).

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De modo geral, a utilização de dados provenientes de sensoriamento remoto era inicialmente limitada, principalmente devido ao custo para aquisição dos dados e à dificuldade de aquisição de imagens para determinadas áreas (NEGENDRA 2013). No entanto, com essa ampla gama de tecnologias e inovações, a utilização destes dados se tornou mais acessível e indispensável, sendo cada vez mais utilizados para monitoramento da natureza (NAGENDRA; ROCCHINI, 2008).

Desse modo, grandes projetos de monitoramento têm sido realizados em todo o mundo. No Brasil, destaca-se o programa PRODES (Programa de Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite), que realiza o monitoramento da Amazônia legal brasileira desde 1988 (INPE, 2020), e outros programas como o Programa Queimadas. Esses programas apresentam grande importância, principalmente relacionada ao fornecimento de dados para fiscalização e controle desses fenômenos.

É importante destacar ainda, que a utilização de dados provenientes de sensoriamento remoto, devem ser utilizados em conjunto com informações de campo, permitindo avaliar e validar as informações obtidas com os sensores. Além disso, quando se trabalha com imagens de sensoriamento remoto, é necessário avaliar algumas características dos sensores, como as resoluções espacial, temporal, radiométrica e espectral e observar se essas resoluções são compatíveis com os objetivos desejados, permitindo, por exemplo, avaliar mudanças na perda, degradação e fragmentação de um habitat.

As técnicas e sensores estão evoluindo a cada dia, aumentando a disponibilidade de dados e o acesso à dados gratuitos, possibilitando análises em grandes extensões. Desse modo, o sensoriamento remoto será cada vez mais necessário e se tornará uma ferramenta indispensável para o monitoramento e conservação dos ecossistemas.








REFERÊNCIAS

ALI, I.; GREIFENEDER, F.; STAMENKOVIC, J.; NEUMANN, M.; NOTARNICOLA, C. Review of machine learning approaches for biomass and soil moisture retrievals from remote sensing data. Remote Sensing, v. 7, p.16398–16421, 2015.

BOYD, D. S.; DANSON, F. M. Satellite remote sensing of forest resources: three decades of research development. Progress in Physical Geography, v. 29, n. 1, p.1-26, 2005.

COOPS, N.C.; HILKER, T.;WULDER, M.A.; NEWNHAM, G.; TROFYMOW, J.A. Estimating canopy structure of Douglas-fir forest stands from discrete-return LiDAR. Trees, v. 21, p. 295–310, 2007.

DIVISÃO DE GERAÇÃO DE IMAGENS – INPE. Landsat. Disponível em: http://www.dgi.inpe.br/documentacao/satelites/landsat#:~:text=Esse%20programa%20foi%20inicialmente%20denominado,%2D1%20ou%20LANDSAT%2D1. Acessado em 24 de novembro de 2020.

EISFELDER, C.; KUENZER, C.; DECH, S. Derivation of biomass information for semi-arid areas using remote-sensing data. International Journal of Remote Sensing, v.33, p.2937–2984, 2011.

ENGELBRECHT, J. et al. A simple normalized difference approach to burnt área mapping using multi-polarisation C-band SAR. Remote Sensing, v.9, p.764, 2017.

INPE – Coordenação Geral de Observação da Terra. Prodes – Amazônia. Disponível em: http://www.obt.inpe.br/OBT/assuntos/programas/amazonia/prodes. Acesso em: 25 de novembro de 2020.

JUSTICE, C.O. et al. The moderate resolution imaging spectroradiometer (MODIS): land remote sensing for global change research. IEEE Transactions on Geoscience and Remote Sensing, v. 36, n.4, p.1228-1249, 1998.

KROSS, A.; MCNAIRN, H.; LAPEN, D.; SUNOHARA, M.; CHAMPAGNE, C. Assessment of RapidEye vegetation indices for estimation of leaf area index and biomass in corn and soybean crops. International Journal of Applied Earth Observation and Geoinformation, v. 34, p.235-248, 2015.

LAMBIN, E. F. Modelling and monitoring land-cover change processes in tropical regions. Progress in Physical Geography, v.21, n.3, p.375-393, 1997.

LORENA, R. B. Linking spatial patterns of land-use to agents of deforestation in the Brazilian Amazon. 176 p. Tese (Doutorado em Ciências) – Universidade Católica de Louvain, Louvain-la-Neuve, 2008.

MORALES-HIDALGO, D. et al. Status and trends in global primary forest, protected areas, and areas designated for conservation of biodiversity from the Global Forest Resources Assessment 2015. Forest Ecology and Management, v. 352, p. 68–77, 2015.

MUCHONEY, D.M., WILLIAMS, M. Building a 2010 biodiversity conservation data baseline: contributions of the Group on Earth Observations. Ecol. Res. 25, 937–946, 2010.

NAGENDRA, H. et al. Remote sensing for conservation monitoring: Assessing protected areas, habitat extent, habitat condition, species diversity, and threats. Ecological Indicators, v. 33, p. 45-59, 2013.

NAGENDRA, H., ROCCHINI, D. High resolution satellite imagery for tropical biodiversity studies: The devil is in the detail. Biodivers. Conserv. v.17, p. 3431–3442, 2008.

OLIVEIRA, R. S. D. et al. Dinâmica de uso e cobertura da terra das regiões de integração do Araguaia e Tapajós/PA, para os anos de 2008 e 2010. Revista Brasileira de Cartografia, v. 68, n.7, p. 1411-1424, 2016.

PINTY, B.; VERSTRAETE, M. M. GEMI: a non-linear index to monitor global vegetation from satellites. Vegetatio, v.101, n.1, p.15-20, 1992.

ROUSE, J. W.; HASS, R. H.; SCHELL, J. A.; DEERING, D. W.; HARLAN, J. C. Monitoring the vernal advancements and retrogradation (greenwave effect) of natural vegetation. Washington: NASA/GSFC, 1974. 371p.

SEIDL, R. et al. Forest disturbances under climate change. Nature climate change, v.7, p. 395-402, 2017.

TEILLET, P.; STAENZ, K.; WILLIAM, D. Effects of spectral, spatial, and radiometric characteristics on remote sensing vegetation indices of forested regions. Remote Sensing of Enviroment, v.61, p.139-149, 1997.

WHITE, J.C.; COOPS, N. C.; WULDER, M.A.; VASTARANTA, M.; HILKER, T.; TOMPALSKI, P. Remote Sensing Technologies for Enhancing Forest Inventories: A Review. Canadian Journal of Remote Sensing, v. 42, p.619-641, 2016.

WHITE, P. S.; PICKETT, S. T. A. in The Ecology of Natural Disturbance and Patch Dynamics (eds Pickett, S. T. A. & White, P. S.) 3–13 (Academic Press, 1985).